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Pescadores, Conhecimento Local e Mudanças Costeiras no Litoral Português
2012

Tipo de Publicação: Artigo

Delicado, Ana, Schmidt, Luísa, Guerreiro, Susana e Gomes, Carla (2012). “Pescadores, conhecimento local e mudanças costeiras no litoral Português”. Revista de Gestão Costeira Integrada. 17. pp. 1-15.

As alterações climáticas são um dos maiores desafios que a sociedade enfrenta atualmente. As comunidades costeiras são particularmente vulneráveis, uma vez que estão crescentemente expostas aos riscos de erosão costeira e de subida do nível do mar. Os pescadores que vivem na e da costa têm uma visão privilegiada das mudanças costeiras e, em resultado da sua atividade, detêm um conhecimento que, apesar de não ser técnico, se baseia na experiência e é específico ao local. Em Portugal, este é um tema ainda pouco explorado e são raros os estudos das ciências sociais sobre as comunidades piscatórias. Este estudo pretende assim ser um contributo para uma temática
que se encontra num estado ainda muito incipiente no nosso país. Para tal, analisamos os discursos de uma amostra de entrevistas em profundidade realizadas a pescadores de três zonas da costa portuguesa – Vagueira, Costa da Caparica e Quarteira. Os resultados revelam a existência de um conhecimento específico e profundo acerca da evolução da costa, das mudanças costeiras e das suas causas. Concluímos, através dos seus discursos, que os pescadores compreendem a complexidade das questões costeiras e a multiplicidade de fatores e usos que a influenciam. São também críticos em relação às opções técnicas que têm sido tomadas. Apesar de se verificarem algumas diferenças entre as três zonas de estudo na análise que os entrevistados fazem da eficácia das obras de proteção costeira, todos são capazes de propor medidas alternativas para mitigar o avanço o mar e a erosão costeira. Verifica-se ainda que este saber local não só não é incorporado nas soluções técnicas de gestão costeira, como os pescadores não são consultados aquando da tomada de decisões que os afetam diretamente. Tal poderá dever-se, por um lado, a uma desvalorização social da própria atividade pesqueira o que terá originado uma auto-avaliação
negativa do valor social dos pescadores, refletindo-se numa incapacidade de reivindicação, só parcialmente ultrapassada quando estes são representados em associações ou sindicatos. Para além deste estatuto social inferior, parece haver também uma certa “incompatibilidade cultural” e de linguagem entre pescadores e especialistas, dificultando ainda mais o diálogo entre os dois e a incorporação do conhecimento local em decisões técnicas.

Publicação associada ao Projecto CHANGE.